As Constituições existem para delinear os valores mantidos normalmente por todos os indivíduos. A longevidade e a força de uma constituição são determinadas pela aplicabilidade destes valores a todos os indivíduos na sociedade. A Constituição prevê um quadro normativo em que os indivíduos podem julgar o estado actual da sociedade em função da projecção dos seus ideais. Através desta reflexão, os indivíduos podem defender a reforma constitucional no intuito de se dar mais um passo na direcção da realização dos ideais apresentadas e reflectidos no texto constitucional.
A Constituição é essencialmente um documento estruturante, que define o sistema de governo, os poderes dos órgãos de governo, e os valores que transcendem a autoridade desses mesmos órgãos. Definindo os limites do governo, a Constituição visa proteger a liberdade individual e a consagração da justiça para todos os indivíduos. As mudanças e alterações introduzidas poderão reflectir a evolução das condições sociais e um maior reconhecimento dos direitos individuais. Enquanto os cidadãos acreditarem que os valores fundamentais da Constituição podem ser resgatados a partir de interpretações correctas e adaptadas aos desafios que enfrenta a sociedade, a Constituição continua a ser legítima.
A principal finalidade da Constituição é delinear escolhas de valor fundamentais no seio da sociedade. A Constituição faz com que esses valores se tornem transcendentes a qualquer poder imposto por uma qualquer maioria governamental. Exemplos desses valores fundamentais incluem a separação dos poderes, a liberdade de expressão, o direito de justiça, entre outros. O desafio na interpretação da Constituição reside na ambiguidade subjacente ao esforço para aplicar estes valores a situações actuais, como o crescimento do poder executivo e a subjugação aos mecanismos económicos. Gerações sucessivas aceitaram modificações e alterações às interpretações dos fundadores desses valores com relação a suas próprias circunstâncias históricas. A Constituição não foi criada para preservar um sistema já existente de governança, mas para se aperfeiçoar no reconhecimento de valores que o sistema anterior não conseguiu reconhecer.
Os valores estabelecidos pela Constituição fornecem um ponto de referência para avaliar actuais questões constitucionais que se colocam tal como a questão de incluir valores explícitos dos défices orçamentais. E é por tudo isto e pela sua normatividade que sou contra a inclusão de qualquer referência numerária delimitando o défice orçamental na constituição. Não impedindo no entanto de considerar pertinente a inclusão e a determinação de princípios de equilíbrio orçamental que evitem situações de endividamento a que chegamos.
Não tenho dúvidas quanto á forma, mas sim quanto ao conteúdo.
Nuno Serra Pereira
Lisboa, 16 de Dezembro de 2011.
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