No Sacro Império Romano-Germânico, os eleitores ou príncipes-eleitores tinham a função de eleger o Rei dos Romanos, mais tarde reconhecidos como governadores quase-independentes dentro dos seus territórios.
quarta-feira, 5 de dezembro de 2012
quarta-feira, 28 de novembro de 2012
Cultura em tempo de crise
Nesta fase final de discussão do OE para 2013 volto a uma área que me é particularmente cara (também por investir na mesma na aquisição de produtos culturais!) e que insisto que é um dos pilares estruturantes da sociedade e do nosso país. A cultura pois claro.
Cabe em primeiro lugar definir (ou redefinir) os pressupostos que enquadrem politicamente o sector. Refiro-me, em concreto, às funções do Estado. Na minha opinião menos Estado, melhor Estado. Não quero com isto dizer ausência de Estado, muito menos em áreas relativas à soberania, identidade e social, lato senso. Um Estado mais reduzido e melhor organizado pode com maior eficiência e eficácia utilizar os dinheiros públicos e prestar um verdadeiro serviço público de qualidade. O Estado não pode e não deve chegar, ou tentar chegar, a todo o lado. Se continuar a persistir nesse erro será o primeiro passo para o seu insucesso, como aliás, e infelizmente, tem sido notório.
Se a crise actual pode trazer algo de bom isso poderá ser o ponderar-se os problemas e a situação global com uma seriedade ainda maior e um sentido de realismo mais apurado. O realismo não deverá implicar o fim do idealismo. Deverá antes fazer com que este seja melhor doseado e coexistirem em proporções mais equilibradas. Quero referir-me particularmente em relação ao sector cultural e criativo. Se o OE deveria ser mais generoso para a cultura, deveria. Se o sector tem de participar no esforço colectivo nesta situação de resgate financeiro, efectivamente terá. Contudo há que ter em atenção uma série de aspectos. Vejamos então. O Estado, naturalmente na minha perspectiva, não deve ter uma política de gosto, não deve ser dirigista, deve promover e incentivar a diversidade e o acesso às actividades e bens culturais.
Será incorrecto, e injusto também, para os agentes e operadores privados do sector cultural e criativo (SCC) que tanto contribuem para a produtividade do país, para a dinamização socio-económica, reduzi-lo à acção do Estado. Vários estudos nacionais (por exemplo o de Augusto Mateus & Associados de 2010) e internacionais (como o da Kea European Research de 2006 para a Comissão Europeia) apontam e atestam que o sector cultural e criativo, nos seus múltiplos ramos, acrescentam valor, produtividade e emprego. No caso português em 2006 o SCC foi responsável por 2,8% de toda a riqueza produzida no país e representava então 2,6% do emprego nacional. A nível europeu em 2003 o SCC representou 2,6 % do PIB da União Europeia (UE). Em 2004 o sector empregava 3,1 % da população europeia activa da UE a 25. Não sendo exaustivo e para citar apenas alguns números ilustrativos fica uma imagem do potencial do sector, em particular das indústrias culturais e criativas como fatia relevante e não estatal do sector. São também contributos para desmistificar a relação entre cultura e economia que nada têm de oposto e muito de entrosamento e complementaridade.
Assim o Estado deverá arranjar mecanismos, enquadrar-se e em simultâneo estimular a concepção de um novo paradigma. Sim é mesmo necessário arranjar um novo paradigma, assim como para o designado Estado social. Rever e reorganizar o Estado social é assegurar a sua sustentabilidade e não acabar com ele como alguns, com desconhecimento ou má fé na maioria dos casos, propagandeiam. Na área da governação da cultura deve haver um processo nesse aspecto semelhante. A política é feita de opções e de uma gestão que deve ser criteriosa. A contratualização com privados, parcerias público-privadas, desde que bem negociadas naturalmente, onde seja assegurado o serviço público e o Estado não acarrete apenas os prejuízos da actividade ou exploração como em variados casos temos verificado. O recurso a soluções empresariais fora da estrutura ou da administração directa do Estado nas quais seja igualmente assegurado o serviço público, com uma gestão mais flexível e eficaz, onde uma gestão profissional pode mais facilmente aliar-se a uma gestão cultural.
Num debate recente sobre economia e cultura a propósito do OE 2013 que teve lugar no teatro S. Luiz em Lisboa a Professora Raquel Henriques da Silva alertou precisamente para essa necessidade. Casos como a Fundação de Serralves ou a Parques de Sintra- Monte da Lua (PSML), esta última com accionistas exclusivamente públicos, são exemplos a acompanhar, avaliar e possivelmente expandir. Deixar de lado os chavões a cultura não é negócio ou entregar a exploração de património cultural a privados ou ainda o desrespeito pelos deveres constitucionais do Estado e com um sentido de responsabilidade e razoabilidade adoptar-se soluções de gestão do património cultural mas também de outros campos culturais condizentes com as necessidades actuais e com a preparação do futuro.
São propostas concretas e contributos específicos para uma tentativa de melhoria do panorama cultural em Portugal, designadamente a nível governativo mas não só. Se o próprio Estado não sufocar e der margem de manobra aos privados e a instituições da sociedade civil estas acabarão por prestar um autêntico serviço público sem os condicionalismos da dependência do aparelho de Estado. Tal cenário a funcionar em conjunto com as áreas onde o Estado central ou local efectivamente deve estar, quer a título directo quer com uma participação supletiva, levará a mais qualidade e diversidade na oferta cultural e um maior acesso à sua fruição bem como uma melhor preservação e valorização dos bens culturais. Ganhariamos todos não só enquanto contribuintes mas nas nossas mútiplas facetas de visitantes, espectadores, consumidores, cidadãos.
domingo, 7 de outubro de 2012
Oportunismo e Oportunidade
Podemos constatar um feriado do 5 de Outubro atribulado, sui generis e muito republicano, ao contrário do que alguns disseram. Desde a bandeira nacional invertida a ser hasteada pelo PR e pelo Presidente da CML a uma cerimónia comemorativa vedada a populares presenciámos uma boa ilustração da República enquanto regime (já a I República havia rapidamente demonstrado que ludibriara o Povo que não a apoiou de base) e do muito trabalho que ainda está por fazer para um desenvolvimento consistente do regime democrático e do Estado de direito. E de uma mudança do próprio regime. Mas a esse assunto voltarei numa outra ocasião.
Desta feita e depois de um feriado caricato num regime mais do que caricaturável temos uma oposição igualmente caricata. Pior ainda, demagógica e oportunista.
Enquanto vivemos um período nada fácil, em que tem de ser discutido um OE em contexto de resgate financeiro e de dependência externa a níveis mais elevados do que seriam desejáveis, surge o maior partido da oposição (e já agora o discurso do Presidente da CML na dita cerimónia...) com uma dose de demagogia e de oportunismo político agoniantes. O edil lisboeta (que apesar de eleito para tal parece já vestir outra casaca...) fala de apostas na educação, na cultura, nas indústrias criativas, na economia do conhecimento, temas que são na realidade importantes, mas convinientemente toma por esquecido o actual contexto e disserta sobre este temas, ou melhor enuncia-os, como tudo de normal se estivesse a passar neste país e não vivessemos uma situação de excepção. O PS ignorando também o actual contexto, ou pior ainda aproveitando-se dele (ainda para mais sendo um dos principais responsáveis pelo mesmo!) vem propor, já sem falar na irrelevância de repor o feriado a 5 de Outubro, uma redução do número de deputados na Assembleia da República. É verdade que a Constituição Portuguesa contempla a possiblidade de um mínimo de 180 e um máximo de 230 deputados. É verdade também que se tem optado pelos 230 representantes eleitos para assegurar uma maior e mais ampla proporcionalidade e diversidade. Seria prejudicial a essas importantes permissas de pluralismo e funcionamento democrático um estreitar do caminho no sentido do bipartidarismo. É precisamente isso que o PS encapotadamente pretende, assim como, irresponsavelmente, gerar fissuras numa coligação que se quer sólida a bem da estabilidade política para os desafios difíceis e a situação delicada que atravessamos.
Para além da proposta em si ser rejeitável é a oportunidade da sua apresentação neste momento, que é na verdade, condenável. Puro oportunismo político. Em vez de ter uma atitude pedagógica opta por uma pouco vertical e demagógica. Talvez por insegurança de Seguro face à sua pouca consistência e ausência de propostas sérias e credíveis surge um Carneiro (José Luís, da Federação do PS Porto) a balir a dita proposta. Aproveitam-se do populismo fácil e de uma opinião pública, neste e noutros aspectos, pouco esclarecida e informada e servem-lhe de caixa de ressonância. A falar de uma reforma do sistema político por que não trabalhar ideias mais válidas, com maior impacte e relevância quer orçamental quer política, e submetê-las a debate num momento mais apropriado que não as vésperas da discussão de um OE particularmente complicado? Parece que isso seria pedir demais ao PS... A actual governação e o próprio país só teriam a ganhar com uma oposição construtiva e responsável. Mas a opção tem sido outra. Perdemos todos. No geral. E a paciência em particular.
sexta-feira, 5 de outubro de 2012
O estado da República!
"Poucos populares, mais polícias e jornalistas do que cidadãos anónimos estiveram hoje de manhã, na Praça do Município, na abertura da cerimónia do 5 de Outubro. No último ano em que a implantação da República é feriado em Portugal, a bandeira portuguesa foi hasteada ao contrário."in DN de 5 de Outubro de 2012
E assim está o estado da República de pernas para o ar e quem melhor que o "Sr. Silva" para fazer as honras da casa!
Sintra, 5 de Outubro de 2012.
Nuno Serra Pereira
domingo, 16 de setembro de 2012
Direito à indignação. Dever da responsabilidade.
O país abusou, desperdiçou, viveu acima das suas possibilidades reais, e quando digo o país refiro-me aos governos através das suas opções políticas erradas, aos cidadãos que em múltiplas situações sustentaram artificialmente o seu bem-estar através do crédito fácil, irresponsavelmente incentivado por instituições financeiras. O último governo socialista agravou consideravelmente toda a situação de ruína financeira, fraco crescimento económico e desenvolvimento social. A crise financeira, depois económica e social, internacional também. Restou-nos um pedido de empréstimo a instituições internacionais, UE, FMI, BCE, por uma questão de sobrevivência. Não tenhamos ilusões era a bancarrota e respectivas consequências graves ou o pedido de empréstimo, que tarde e a más horas acabou por ser solicitado pelo governo socialista em funções na altura. Este segundo cenário não está isento de consequências gravosas pelas exigências de austeridade que implica. A maior parte das pessoas creio conseguir perceber isto, mais não seja por comparação com a economia familiar. Quem vive acima das suas possibilidades, mais tarde ou mais cedo vai ter, de alguma forma, de pagar a factura. Se quer fazê-lo de forma honrada e responsável vai ter de se limitar nas suas opções, ou seja, vai ter de viver sob austeridade, perdendo autonomia de decisão. Agora importa sublinhar que dentro da própria austeridade, que inegavelmente deve ser um equilíbrio entre o aumento das receitas e a diminuição das despesas do Estado, há margem para decisões, ainda que mais ou menos condicionadas. Há um governo eleito, tem um programa eleitoral e de governo que foi sufragado pelo voto popular, a democracia participativa tanto quanto se sabe não foi nem cancelada nem suspensa e Portugal ainda é uma nação soberana, temporaria e condicionadamente soberana, mas em todo o caso com uma identidade a salvaguardar.
É conhecido que o aumento excessivo de impostos e taxas não avoluma as receitas do próprio Estado, é algo contraproducente e que curiosamente, ou talvez não, incentiva o alastrar de uma economia paralela. Se o facturar faz o país avançar como diz o slogan da Autoridade Tributária, o excesso de impostos, mesmo em contexto de austeridade e de empréstimo internacional, faz o país regredir. Tem de haver bom senso, austeridade sensata, eficiente e eficaz e não actos que mais parecem de sadismo político.
A questão do aumento da Taxa Social Única do lado dos trabalhadores gerou uma onda de contestação e fez aumentar o número de vozes, em muitos casos e apesar da contrariedade comprensivas em relação a cortes e a medidas de contenção neste período difícil mas que os excessos mais do que violentos recentemente anunciados (e que podem ser revistos até à votação do OE para 2013) fez quebrar, de forma julgo que ainda reversível.
Existe uma maioria parlamentar, existem compromissos internacionais em curso, seria por isso descabido, infrutífero e indesejável juntar às dificuldades presentes uma crise política. Na manifestação de ontem, bastante participada é verdade pois as pessoas têm o direito à indignação, muitas coisas irresponsáveis foram proferidas. Não adianta mandar este governo embora (uma remodelação dentro da maioria legitimamente eleita é a melhor opção), não adianta lançar insultos e generalizações, não adianta fingir que não existe um empréstimo do Estado português que implica contenção orçamental e redução do investimento público, não adianta ser demagógio e criticar sem propor alternativas, que de facto não são fáceis de definir e vislumbrar. Se existe direito à indignação deve haver também o dever de responsabilidade. De todos. É a única forma que conheço de potenciar a prática e o usufruto da Liberdade que ainda vamos tendo para viver, pensar, agir, opinar.
É conhecido que o aumento excessivo de impostos e taxas não avoluma as receitas do próprio Estado, é algo contraproducente e que curiosamente, ou talvez não, incentiva o alastrar de uma economia paralela. Se o facturar faz o país avançar como diz o slogan da Autoridade Tributária, o excesso de impostos, mesmo em contexto de austeridade e de empréstimo internacional, faz o país regredir. Tem de haver bom senso, austeridade sensata, eficiente e eficaz e não actos que mais parecem de sadismo político.
A questão do aumento da Taxa Social Única do lado dos trabalhadores gerou uma onda de contestação e fez aumentar o número de vozes, em muitos casos e apesar da contrariedade comprensivas em relação a cortes e a medidas de contenção neste período difícil mas que os excessos mais do que violentos recentemente anunciados (e que podem ser revistos até à votação do OE para 2013) fez quebrar, de forma julgo que ainda reversível.
Existe uma maioria parlamentar, existem compromissos internacionais em curso, seria por isso descabido, infrutífero e indesejável juntar às dificuldades presentes uma crise política. Na manifestação de ontem, bastante participada é verdade pois as pessoas têm o direito à indignação, muitas coisas irresponsáveis foram proferidas. Não adianta mandar este governo embora (uma remodelação dentro da maioria legitimamente eleita é a melhor opção), não adianta lançar insultos e generalizações, não adianta fingir que não existe um empréstimo do Estado português que implica contenção orçamental e redução do investimento público, não adianta ser demagógio e criticar sem propor alternativas, que de facto não são fáceis de definir e vislumbrar. Se existe direito à indignação deve haver também o dever de responsabilidade. De todos. É a única forma que conheço de potenciar a prática e o usufruto da Liberdade que ainda vamos tendo para viver, pensar, agir, opinar.
segunda-feira, 10 de setembro de 2012
Nós somos a Elite...
Estava a ver o programa, do Mário Crespo, no qual participava Carlos Zorrinho, defendendo de maneira
cega o seu imaculado PS justificando nas suas palavras que o passado (no qual se orgulhou de participar) e que tanto penhorou o nosso futuro, já lá vai! Quando de repente da sua parte ouvi o que pensava não ter ouvido. “Nós que aqui estamos presentes temos
consciência de que somos uma elite”…um zumbido sobrepôs-se à minha audição.
O resto do debate deixou de ser importante, esta sim era a “tirada” que
espelhava o que nos aconteceu nos últimos anos. Lembrei-me de Gaetano Mosca que se ocupou exclusivamente das elites
políticas, embora não utilizasse o termo “elite”
mas sim “classe política”. A recusa
do termo “elite” justifica-se na
medida em que o seu significado pode conduzir à ideia de que aqueles que estão
no poder sejam os elementos melhores da sociedade. Segundo o autor, as minorias
governantes são (deveriam ser) formadas por indivíduos que "se distinguem da massa dos governados por
certas qualidades que lhes dão uma certa superioridade material, intelectual ou
mesmo moral (...)" Este è verdadeiramente o problema, a sociedade
não se revê na actual “classe política”,
no fundo eles são o que Robert Dahl descreve
como sendo um grupo minoritário que exerce “dominação política” sobre a maioria, dentro de um sistema
de poder democrático. E quando se vê no poder organiza-se de tal
modo que mantém, a longo prazo, a própria posição, tutelando os seus
interesses, utilizando para isso os meios públicos à sua disposição. Posicionando-se
em locais hierárquicos de diferentes instituições públicas, partidos ou
organizações de classe, ou seja, pode ser entendido simplesmente (não podendo
ser mais actual), como aqueles que têm capacidade de tomar decisões políticas
ou económicas. Podemos incluir no “universo
elitista” de Zorrinho (e outros)
os “formadores de opinião” designando
aquelas pessoas ou grupos capazes de formar e difundir opiniões que servem como
referência para os demais membros da sociedade. Só que estes estão longe de um
“intelectual orgânico”, tal como era
definido por Gramsci. Neste caso, o conceito de formação da “opinião pública” é substituída pela
ideia de “construção ideológica”,
entendida como a direção política tomada num dado momento histórico. Sob este
aspecto, esta “elite” deixou há muito
de cumprir o seu papel de dirigente social e cultural, de estabelecer de se afirmar numa ideologia. Deixando assim no
decorrer do seu discurso o “vazio” na
longa batalha que constitui a história da vida, onde todo o esforço é contrariado
por dificuldades, até que a vitória seja conquistada.
Nuno Serra Pereira, 11 de Setembro de 2012.
sexta-feira, 7 de setembro de 2012
O Turista Acidental...
O líder socialista elogiou a
decisão do Banco Central Europeu (BCE) de criar um novo programa de compra de
dívida soberana no mercado secundário. Ainda bem que Draghi seguiu as
solicitações do iluminado seguro que se expressou nas seguintes declarações:
"Algumas das reivindicações
que tenho vindo a fazer há mais de um ano foram hoje tomadas pelo BCE, que
anunciou decisões muito importantes para a União Europeia e para Portugal
(membro da zona euro). Com esta decisão do BCE Portugal está em condições de
regressar aos mercados no próximo ano", sustentou António José Seguro logo
no início da sua intervenção num fórum promovido pela Federação Nacional de
Educação (FNE).
"O BCE decidiu ter uma
intervenção mais ativa junto dos mercados financeiros para travar a
especulação, garantindo custos de financiamento mais baixos. Com menores custos
de financiamento pagaremos menos juros e os sacrifícios pedidos às pessoas
podem ser aliviados", advogou ainda o secretário-geral do PS.
Este não foi mais do que o
primeiro passo para se salvar o euro. A salvação do euro implica duas coisas:
compras em larga escala de títulos dos países periféricos por parte do BCE e um
sinal de que este estará disponível para permitir uma subida da inflação (que
tanto aflige os alemães desde a 2ª Guerra Mundial) para fazer com que o
ajustamento seja possível. Este é um passo na direção certa, que permite
afirmar a independência do BCE, mas não o suficiente se não for seguido de
outras medidas fundamentais.
O secretário-geral do PS esquece-se
que as medidas de austeridade são para ser aplicadas e os limites do défice
para serem cumpridos, condicionalismos anunciados por Draghi e que serão
impostos aos países que forem alvo de compra de dívida. O regresso ao mercado
ainda que dentro dos prazos anteriormente estabelecidos (2013) permite aliviar
o peso da divida, no entanto não significa que os sacrifícios colectivos possam
abrandar, estes estão directamente relacionados com os cortes na despesa do Estado e os comportamentos e os condicionalismos dos mercados internacionais.
É com esta falta de preparação e
seriedade nas declarações públicas, que se perdem eleições, os portugueses não
são estúpidos e cada vez mais se apercebem daqueles que apelam à ignorância dos
factos, no mediatismo das declarações irresponsáveis do líder da oposição.
Nuno Serra Pereira, 7 de Setembro de 2012.
terça-feira, 15 de maio de 2012
terça-feira, 27 de março de 2012
quarta-feira, 29 de fevereiro de 2012
A Crise do Crescimento Europeu.
Estamos à beira de um novo
Conselho Europeu, desta feita com uma particularidade. Um grupo de 12 chefes de
Governo decidiram que o foco de discussão seria a crise de crescimento na zona
euro, antecipando-se desta forma ao já tradicional e nada democrático encontro
a dois em que Merkel e Sarkozy costumam decidir o que se discute em Bruxelas.
David Cameron lidera o tal grupo
que começa a ficar um pouco impaciente com a estagnação europeia (as previsões
anunciadas ainda esta semana pela EU para 2012 apontam para isso mesmo
acompanhado por uma recessão de 0,3%), achando que é «agora tempo de mostrar liderança e de tomar decisões fortes que dêem
resultados que as sociedades exigem». Ainda há poucos dias atrás, Durão
Barroso Presidente da Comissão Europeia na homenagem ao Professor Ernâni Lopes
na UCP, relembrava aos mais esquecidos que todos os problemas e soluções passam
pela CE e que sem esta a Europa deixa de funcionar.
O erro da Europa foi
considerar-se «a restauração do império
germânico» (este foi o termo utilizado intencionalmente pelo rei prussiano)
como fim, como a expansão final da ideia que tinha levado o povo alemão a
unir-se. Sempre que a Alemanha se une fica muito grande, demasiado grande para
a Europa.
Para evitar uma coligação
negativa, os europeus tem de encarar a Europa com um projecto global para
enfrentar os desafios que vem de fora, seja do Oriente ou do Ocidente. Esta é
sem dúvida a complexidade
do momento em que nos encontramos, reforçar a resposta da União perante os
movimentos inerentes ao fenómeno da Globalização, procurar entender o contexto
para ultrapassar a fraqueza que visivelmente define as suas fronteiras.
Os recursos de cada Estado membro europeu devem ser
aproveitados e não encarados com desconfiança. Tal como referia sabiamente o
Professor Doutor Adriano Moreira na sua crónica no DN desta semana: «No caso português, sem poder ignorar o processo evolutivo do Brasil,
que prudentemente avalia a escolha de futuros entre os compromissos com o
regionalismo sul-americano e a sua própria afirmação de grande potência, a
solidariedade procurada entre os países de língua portuguesa, na organização
que espera mais atenção e desenvolvimento, que é a Comunidade dos Países de
Língua Portuguesa (CPLP), é uma contribuição sua. Não apenas para a
racionalização do globalismo, e para o património imaterial de que se ocupa a
UNESCO, mas também para o interesse desta Europa, à procura de objetivo
estratégico convictamente partilhado, de governança finalmente racionalizada,
com imaginação criadora e lideranças credíveis».
As oportunidades são de todos para todos nunca pondo em
causa as soberanias europeias, perseguindo objectivos comuns de estabilidade e prosperidade para Europa e para o Mundo.
Sintra, 29 de Fevereiro de 2012.
Nuno Serra Pereira
sexta-feira, 10 de fevereiro de 2012
Charles Dickens, dois centenários do seu nascimento.
Este parece ser o mais apto de todos os momentos para chamar a atenção para um dos maiores escritores e "caricaturistas sociais" que a Inglaterra já produziu, Charles Dickens. A influência maravilhosa dos seus escritos exacerbou as linhas de demarcação entre as diferentes classes da sociedade inglesa e originou o estímulo extraordinário e necessário para que a própria sociedade amenizasse a miséria e neutralizasse o crime e o ódio no seu seio. O humor que tanto prazer tem em ser grotesco ou estabelecer uma condição de estranheza a favor do humorista tende a suavizar o pior que reside na moral da sociedade, tornando-o num facto bastante curioso, mas realista. A diferença entre a repulsa pelos nossos próprios pecados e os pecados muito maiores de que nada sabemos dos outros, é quase toda a ignorância, na maior parte das vezes o escritor, o humorista é que nos faz ver que estes últimos são tão naturais para aqueles que se entregam a eles, como os nossos são para nós, ou seja nada para além daquilo que é real e verdadeiro. Ao mesmo tempo, não se pode pensar que toda a sociedade fora completamente imbuída da moralidade de Dickens, o resultado não deve ser visto como apenas a modificação de sentimento para com todos os tipos de males dos quais pouco ou nada são familiarizados com a preferência específica e o tipo particular de carácter próprio de Dickens. Sem dúvida que aprovou certos estereótipos enfatizados pela sociedade, embora acompanhados (como tantas vezes o são) com as auto-indulgentes fraquezas e com um ódio mórbido perfeitamente espelhados nos elementos mais cruéis e mais duros da natureza humana que são fatais à marcação e diferenciação de cada indivíduo. Ainda assim, o ser "diferente" na moralidade literária de Dickens tem na realidade um efeito muito menos marcante na sociedade do que os seus maravilhosos poderes, como humorista social com mestria e astúcia para nos ensinar o que de outro modo não nos poderia ter sido ensinado, que aquilo a que se chama vida "vulgar" está a "transbordar" de todas aquelas qualidades humanas, do bem e do mal, que compõem precisamente o interesse pela natureza humana. O seu deleite pelo grotesco fez muito mais do que até mesmo John Stuart Mill com qualquer defesa filosófica da liberdade poderia ter feito, para nos tornar mais tolerantes com a excentricidade individual de quase todas as "tonalidades" e até mesmo para nos ensinar a acarinhar essa diferenciação de cada um. Deu sem dúvida um maior impulso do que qualquer outro homem da sua geração a um justo sentimento de repulsa em relação ao ódio de classe e de pura crueldade que distingue qualquer sociedade dita evoluída e moderna.
O seu génio, como a maioria dos outros génios, estava na revolta contra o sistema contra o que "tipos" convencionais tendem a produzir.
Lisboa, 10 de Fevereiro de 2012.
Nuno Serra Pereira
quinta-feira, 2 de fevereiro de 2012
"A Europa e o Futuro"
DESTAQUE: PALESTRA DE HOMENAGEM AO PROF. ERNÂNI LOPES
"A Europa e o Futuro"
Dr. José Manuel Durão Barroso, Presidente da Comissão Europeia
Dr. José Manuel Durão Barroso, Presidente da Comissão Europeia
Data: 17 Fevereiro (Sexta-feira), 18h, seguido de Jantar no Hotel Marriott
Local: Auditório Cardeal Medeiros (Piso 1 do Edifício da Biblioteca Universitária João Paulo II)
Nesta ocasião terá lugar igualmente a cerimónia de entrega de diplomas e prémios do IEP-UCP.
Jantar no Hotel Marriott (Sala Mediterrâneo)
Fato Escuro
Preço: 25 Euros Alunos: 15 Euros.
Inscrições para o Jantar até 14 de Fevereiro para secretariado.iep@iep.lisboa.ucp.pt
Local: Auditório Cardeal Medeiros (Piso 1 do Edifício da Biblioteca Universitária João Paulo II)
Nesta ocasião terá lugar igualmente a cerimónia de entrega de diplomas e prémios do IEP-UCP.
Jantar no Hotel Marriott (Sala Mediterrâneo)
Fato Escuro
Preço: 25 Euros Alunos: 15 Euros.
Inscrições para o Jantar até 14 de Fevereiro para secretariado.iep@iep.lisboa.ucp.pt
ENSAIOS: "Uma Política para o Mar"
Nova Cidadania 46 à venda! À venda nas Livrarias Alêtheia, Almedina, Bulhosa, Coimbra Editores, Europa-América, Universidade Católica Portuguesa (Lisboa, Porto, Sintra e Viseu), Wook e directamente no IEP-UCP!
Informações e Pedido de Assinatura: info@novacidadania.pt | Telefone: 21 721 41 29 | http://www.novacidadania.pt/
quarta-feira, 1 de fevereiro de 2012
terça-feira, 31 de janeiro de 2012
“Consolidação orçamental amiga do crescimento económico.”
Expressão retirada do comunicado preliminar da cimeira europeia realizada ontem 30/01/2012.
Será possível conciliar uma vaga de austeridade com um desejo de crescimento económico?
Os defensores da austeridade prevêem que aplicação desta produzirá dividendos rápidos sob a forma do restabelecimento e fortalecimento dos níveis de confiança económica, com poucos ou nenhuns efeitos negativos sobre o crescimento económico e do emprego. Esta é a meu ver, e felizmente para muitos uma maneira errada de ver a questão. Insistir na redução da despesa em períodos de elevados indicies de desemprego é um risco e um erro. Os problemas terão de ser enfrentados sequencialmente, primeiro com um esforço de estimulação e criação de emprego promovendo o crescimento económico e só depois avançar para uma estratégia a longo prazo de redução do défice.
Fazendo da redução do défice um objectivo primário, cerrando fileiras através do aumento dos impostos e cortes na despesa, só vai desacelerar ainda mais o crescimento económico e agravando exponencialmente a taxa do desemprego. Cortar na despesa numa economia que se encontra em recessão acaba por ser contraproducente, mesmo que estes cortes sejam de natureza fiscal. Qualquer poupança na frente da despesa será anulada pela redução da receita fiscal resultante da contracção da economia.
Continuar a alimentar a ilusão criada pela imposição da austeridade fiscal como motivador da confiança necessária e a posterior criação de emprego, é ignorar por completo o exemplo da Grécia que neste momento encara uma situação de bancarrota e inevitável incumprimento dos compromissos assumidos.
A austeridade não é um fim em si mesmo, está a falhar como meio para chegar ao objectivo de reduzir o endividamento ou aumentar a sustentabilidade económica. Não existem exemplos na história de ciclos de austeridade expansionista do ponto de vista económico. E se houve alguns casos em que ajustamentos violentos levaram a um crescimento no curto prazo, aconteceram porque se pode desvalorizar a moeda, algo que não é possível na zona euro.
Se quem investe e está de fora, achar que os dirigentes e os políticos de um modo geral não conseguem ou não querem enfrentar e resolver os problemas estruturais do país, naturalmente deixarão de comprar títulos de divida e apoiar novos quadros de resgate. Essa confiança poderá e deverá ser demonstrada através da implementação de um programa fiscal sério, prevendo acima de tudo as despesas com tendência para aumentar de forma constante, com especial enfoque nos custos provenientes da saúde, poderá ser efectuado também um aumento fiscal pontual e muito especifico. Sem poder recorrer a uma desvalorização efectiva da moeda, a solução passará inevitavelmente por um ajustamento dos salários relativos em baixa. Seria óptimo que o rendimento nominal disponível aumentasse em relação ao nível da divida (fixa). No entanto, o mais que provável aumento dos níveis de desemprego levará à manutenção do crescimento relativamente baixo do salário nominal, estabelecidos automaticamente pelo mercado. A descida dos salários na zona euro nos países com menor competitividade originará o equilíbrio necessário, ou seja as medidas de austeridade por si só não vão tirar os países do abismo em que se encontram, podendo hipotecar deste modo o futuro do Euro como moeda.
No entanto o foco da política europeia continua a ser a austeridade, aplicada transversalmente e em níveis diferentes a todos os países da região. A sua materialização deu-se ontem na cimeira, com a aprovação do Pacto Orçamental, que obriga cada estado membro a não ultrapassar um défice estrutural de 0,5% e a ter uma dívida pública abaixo dos 60% do PIB. Ficam deste modo impossibilitadas as “políticas de estimulo rápido à economia”, ditadas nos anos 30 por Keynes. Procede-se deste modo a eliminação de mais um “instrumento” de política económica, fruto da inexistência em concreto de uma dinâmica económica europeia. A imposição destas regras mostram uma política de interesses isolados, por parte de países como a Alemanha, que não querem que as transferências orçamentais para os países mais frágeis seja uma realidade. Talvez seja mais eficaz e menos doloroso entregarmos, como seria sugerido por “alguém”, a gestão da Grécia à Alemanha e à iluminada Merkel, talvez quem sabe em seguida se lhe entregue o resto da Europa.
A História prega-nos partidas e quer parecer-me que não aprendemos com o passado, nem tão pouco tentamos corrigir o futuro!
Lisboa, 31 de Janeiro de 2012.
Nuno Serra Pereira
domingo, 22 de janeiro de 2012
Guimarães Capital Europeia da Cultura 2012
Está oficialmente inaugurada a Capital Europeia da Cultura 2012. Como sabemos, nem sempre pelos melhores motivos, é Guimarães. Vencimentos, comissão de vencimentos, Fundação Cidade de Guimarães, gestão do projecto foram assuntos polémicos ao longo do ano transato. Polémicas aparte, embora não sei se completamente ultrapassadas, as actividades culturais e a dinâmica da programação arrancou.
Contou com a presença do Presidente da Comissão Europeia que anunciou um aumento de 37 % proposto para o programa "Europa Criativa", o que significa um montante global de 1800 milhões de euros para o próximo ciclo. Sublinhou o que tanta e tantas vezes tenho sublinhado também sobre a importância real e instrínseca da Cultura, o seu valor económico e social, o seu contributo para a criação de emprego, o que justifica plenamente o aumento de investimento anunciado por Durão Barroso. Cerca de 3,5% a 4% do produto interno europeu está directamente ligado às industrias culturais e criativas. Chegou mesmo a referir algo com o qual concordo em pleno e que deve produzir efeitos práticos por todo o espaço europeu, incluíndo Portugal naturalmente "sem Cultura, a Europa não faz qualquer sentido".
É preciso ter presente e convem relembrar a importância destas iniciativas no âmbito da União Europeia e o seu papel de relevo para o conhecimento a uma escala internacional das cidades e regiões que acolhem estes projectos culturais. Enriquecimento da União assente na diversidade regional e cultural, dinamização não só cultural mas também económica e social como mencionado, são aspectos que quando correctamente geridos, programados e divulgados podem constituir mais-valias de natureza diversa para a Europa, os Estados membros e as suas populações.
O turismo como um dos sectores chave da economia nacional (e europeia também, nomeadamente o turismo cultural) não poderá desperdiçar esta oportunidade e deverá mais uma vez servir de ponte entre cultura, economia e sociedade, com resultados que se prolonguem para além do próprio ano de 2012.
O Primeiro-ministro que usou da palavra na cerimónia referiu que apesar dos tempos de crise e de austeridade a cultura nunca deverá ser vista como menor nem ser medida exclusivamente pelas verbas consignadas em sede de orçamento de Estado. Que estas palavras que quero ter como sábias sejam um espelho real da actividade governativa nesta matéria.
domingo, 15 de janeiro de 2012
Ética a régua e esquadro. Transparência entre compassos, pirâmides, colunas e aventais.
Muito se tem falado ultimamente de Maçonaria e lojas maçónicas. Numa visão histórica e perante a falta de documentação rigorosa as opiniões quanto às raízes desta sociedade ou associação são diversas e abarcam um arco temporal tão vasto que podem recuar à Mesopotâmia, Antigo Egipto e ao Templo de Salomão. Outros autores colocam as suas raízes nas associações de pedreiros construtores das catedrais medievais. Há ainda correntes que apontam a influência nas Revoluções Americana e Francesa, portanto na segunda metade do séc. XVIII, como um dos seus expoentes máximos e impulso de dimensão universal.
Àparte das dificuldades de análise historiográfica e numa observação mais contemporânea do fenómeno, que como tantas outras organizações e entidades pode ter degenerado numa outra coisa diferente da sua génese, ou pelo menos ter-se tornado diversa e ter dado aso a diferentes interpretações e práticas de princípios filosóficos eventualmente idênticos numa fase inicial. Dizia eu numa observação mais contemporânea da maçonaria e dos seus agremiados, os maçons, que ainda se reveste de uma auréola de secretismo, que no caso português muito se deverá a perseguições de que foi alvo por vários regimes vigentes desde a monarquia absoluta com D. Maria I e seu intendente Pina Manique, seu neto D. Miguel no período da revolução liberal de 1820 e da guerra civil entre liberais e absolutista ou legitimistas (1832-1834) ou ainda durante o Estado Novo com António de Oliveira Salazar. Hoje em dia a atitude do poder vigente é bem diferente. Dever-se-á ao facto de estarmos numa democracia constitucional de cariz pluralista, onde a liberdade de expressão, de opinião e associação são tónicas dominantes, ou então a própria Maçonaria está bem integrada e disseminada pelas instituições democráticas...
Sem dúvida que essa liberdade existe. Mas como qualquer outra deve ser usada com responsabilidade. Por princípio os titulares de cargos públicos têm responsabilidades acrescidas perante a sociedade e os eleitores e devem estar sujeitos a um escrutínio com uma malha mais apertada do que outros intervenientes na vida democrática. Nas respectivas declarações de interesses e ao abrigo de um regime de incompatibilidades, a bem da transparência, a meu ver deverá constar uma eventual pertença a uma ou mais lojas maçónicas. Se qualquer cidadão tem o direito de pertencer ou de criar uma associação ou organização, se é titular de um cargo público tem também o dever de o declarar publicamente. Quero crer que isto não é violar o direito à privacidade, uma vez que precisamente a privacidade das pessoas públicas e políticas está diminuida (mas deve ser naturalmente protegida por certos limites que admito discutíveis) e as mesmas têm (ou devem ter) consciência disso mesmo quando se candidatam a cargos públicos.
Se a Maçonaria é uma instituição exclusivamente de cariz filosófico e filantrópico não estou a ver qual o problema de maior em os seus membros que desempenhem ou se candidatem a lugares públicos tenham esses mesmo facto registado em público. Mesmo que envolva outras vertentes, que institucionalmente deverão ser naturalmente abarcadas pela Lei de também pela Ética, não vejo por que não a obrigatoriedade de tornar esse facto público. Se os seus membros nada têm a temer perante a Lei e a Ética de ideias e comportamentos parece-me apenas mais um contributo para a transparência e a valorização da democracia. Não consigo identificar qualquer violação de direitos, apenas consigo vislumbrar um possível cumprimento rigoroso de deveres. Surge-me agora a velha máxima que diz "à mulher de César não basta ser séria, há que parecê-l0". Aliás qualquer maçon que queira ter direito ao seu anonimato continuará a tê-lo em pleno, excepto se for candidato ou titular de cargos públicos. Os eleitores, os contribuintes, os cidadãos em geral têm o direito de conhecer esses dados. Uma coisa é ver a privacidade diminuída, o que parece ser algo relativamente normal em quem é ou pretende ser Homem público. Outra coisa é ver a sua intimidade invadida. São esferas diferentes ainda que, por vezes, com fronteiras pouco densas. Mas se pretendermos ter essa participação política devemos ser claros perante o eleitorado, ter a noção da diminuição da privacidade ainda que com direito à intimidade. O pertencer à maçonaria, a uma qualquer religião, ser associado de uma organização profissional, cívica, social ou cultural podendo ter o direito de não o tornar público, pois é uma questão privada ou até íntima num certo sentido, passa a ser privada mas divulgável e nunca íntima para um titular de cargo público. A Ética, sobretudo nessas situações, deve ser rigorosamente cumprida, a régua e esquadro, sem desvios mesmo que possam ser milimétricos.
Não temos de duvidar à partida de todos os membros da maçonaria mas sabemos, como aliás muito provavelmente em qualquer outra organização, há elementos que ao abrigo de ideologias, de ideiais filosóficos, políticos, etc., têm comportamentos pouco éticos ou até legalmente sancionáveis e daí o recurso que se quer equilibrado aos meios de transparência dentro de um conjunto democrático de direitos, liberdades e garantias. Há certamente na Maçonaria maçons que apenas pertencem por convicção filosófica, como haverá aqueles no outro extremo que em nada se revêem nesses valores da igualdade, liberdade e fraternidade e de Deus grande arquitecto do universo e se aproveitam da organização para fins menos próprios e/ou menos lícitos. Entre estes dois extremos haverá, porventura, um sem número de estádios e situações diversas que não conseguirei identificar com rigor, como aliás acontece em relação a alegados fins mais cooperativos e menos filosóficos ou filantrópicos, de loobies mais ou menos ocultos, da Maçonaria enquanto instituição ou agremiação. Pelo menos a sua história atesta a presença e pertença de importantes élites políticas, económicas e culturais com grande influência nas sociedades donde provêm assim como a uma diversidade relativa de membros, ou seja, mais elitista do que democrática. Tudo o mais já será especulação excessiva que exige um outro conhecimento mais aprofundado da realidade em questão. Se tem outra opinião ou outro conhecimento da matéria comente. Vamos ao debate.
P.S. A imagem ilustrativa "Transparência" é da autoria de Alejandro Santos.
terça-feira, 10 de janeiro de 2012
Em defesa da Maçonaria
«Pela primeira vez na minha vida fabriquei uma bomba. Cerquei o seu dynamite de verdade com um invólucro de raciocínio; puz-lhe um rastilho de humorismo. Feita, atirei-a aos opositores da Maçonaria. E o effeito foi não só retumbante mas milagroso. Perderam a cabeça sem a ter.»
Fernando Pessoa
Para começar, tal como Pessoa refere no seu artigo, publicado no Diário de Noticias de Fevereiro de 1935, «começo por uma referencia pessoal, que cuido, por necessária, não dever evitar. Não sou maçon, nem pertenço a qualquer outra Ordem, semelhante ou diferente. Não sou porém anti-maçon, pois o que sei do assunto me leva a ter uma ideia absolutamente favorável da ordem Maçónica». Talvez fizesse uma pequena alteração no “favorável da”, por “tolerante à”.
A Ordem Maçónica é secreta pela mesma razão porque eram secretos os Mistérios antigos, incluindo os dos cristãos, que se reuniam em segredo, para louvar a Deus, enquadrando-se hoje no que seriam Lojas ou Capítulos. Para se distinguirem dos profanos, tinham fórmulas de reconhecimento, toques ou palavras passe. Por esse motivo os romanos chamavam-nos de «ateus, inimigos da sociedade, e inimigos do Império», adjectivos utilizados para classificar os maçons à luz da actual Igreja Romana, longe dos desígnios maçons mais remotos.
Os elementos que compõem a Maçonaria são, o elemento iniciático que lhe confere o secretismo, o elemento humano que resulta da pluralidade social. Este em função do momento histórico perante diferentes culturas, assume interpretações que poderão ser vistas como controversas, eu diria circunstanciais. O que nos leva ao terceiro elemento que é o da tolerância, não impondo a alguém dogma nenhum, deixando correr o pensamento livremente de cada um, o que por si só justifica a ausência doutrinaria da maçonaria.
Nenhum acto político ocasional deverá ser interpretado como uma Obediência(que deverão ser autónomas e independentes) imputada à Maçonaria em geral. Muitas das vezes são, circunstâncias políticas do momento, que originam deturpações, que a Maçonaria não criou. Esta, ou qualquer outro tipo de associação não deverá ser avaliada pelos actos ocasionais manifestando relações indevidas entre o interesse público e privado.
Sejamos justos nas nossas avaliações e na herança histórica e universal. São disso exemplos: «na religião, os jesuítas deveriam estar agradecidos por lhes ter sido dado acolhimento e liberdade na Prússia pelo maçon Frederico II, no século dezoito, quando foram expulsos de toda a parte e repudiados pelo próprio Pápa; como no desfecho histórico da vitória em Waterloo, protagonizada por Wellington e Blücher, ambos maçons, ou naquela em que viria a assentar a vitória dos aliados, a Entente Cordiale, obra do maçon Eduardo VII; na cultura uma das maiores obras literárias modernas, o Fausto do maçon Goethe».
O debater e o saber abrem as portas do que é universal e oculto, a inteligência salvaguarda o conhecimento e perpetua o enigma para os que se fecham na ignorância.
PS: Obrigado Pedro pelo livro de Fernando Pessoa, “Associações Secretas e outros escritos”, ÁTICA Prosa, Babel – Obras de Fernando Pessoa Nova série. Que deveria ser de leitura, se não obrigatória pelo menos aconselhada!
Lisboa, 10 de Janeiro de 2012.
Nuno Serra Pereira
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